Capa/Cover

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Pensamento em uma frase/ Thought in a sentence ...

"A maioria dos filósofos tentam construir uma filosofia do homem dentro da natureza, enquanto que Spinoza construiu uma Filosofia da Natureza dentro do homem"


"Most philosophers try to construct a philosophy of the man within nature, while Spinoza built a philosophy of Nature inside the man"

Imagens e textos unindo Spinoza a Einstein/ Images and texts linking Spinoza and Einstein

Imagens e textos unindo Spinoza a Einstein/ Images and texts linking Spinoza and Einstein
A aura de Spinoza paira sobre Einstein

Pequena casa em Rijnsburg

Livro de Registro da casa de Spinoza (Visita de Einstein em 1920)

Poema de Einstein para Spinoza/Poem by Einstein dedicated to Spinoza

Wie lieb ich diesen edlen Mann
Mehr als ich mit Worten sagen kann.
Doch fuercht’ ich, dass er bleibt allein
Mit seinem strahlenden Heiligenschein.


Como amo esse nobre senhor,
mais do que expressar sou capaz.
Com sua auréola de esplendor,
Temo, porém que ficará a sós.

(Albert Einstein, Zu Spinozas Ethic)

Poema de Borges para Spinoza/Poem by Borges dedicated to Spinoza


Bruma de oro, el Occidente alumbra
La ventana. El asiduo manuscrito
Aguarda, ya cargado de infinito.
Alguien construye a Dios en la penumbra.
Un hombre engendra a Dios. Es un judío
De tristes ojos y de piel cetrina;
Lo lleva el tiempo como lleva el río
Una hoja en el agua declina.
No importa. El hechicero insiste y labra
A Dios con geometría delicada;
Desde su enfermedad, desde su nada,
Sigue erigiendo Dios con la palabra.
El mas pródigo amor le fue otorgado,
El amor que no espera ser amado.


(Jorge Luis Borges, Obra Poética)
































DEUS JOGA DADOS OU XADREZ COM OS HOMENS?
Spinoza nos diz:
1ª. - Uma coisa que é determinada por Deus a qualquer ação não pode tornar-se a si própria indeterminada.
2ª. - Na natureza nada existe de contingente, antes, tudo é determinado pela necessidade da natureza divina a existir e a agir de modo certo.
3ª. - As coisas não poderiam ter sido produzidas por Deus de maneira diversa e noutra ordem do que têm.
4ª. - É da natureza da razão considerar as coisas necessárias e não contingentes, no entanto, imaginamos as coisas como contingentes somente em razão da insuficiência do nosso conhecimento.

Em linguagem popular essas 4 proposições podem ser resumidas com o dito popular: “nada ocorre por acaso, tudo tem uma razão (causa) de ser. Se alguma coisa nos parece aleatória é tão somente porque não conhecemos as causas que a produziram.
Einstein responde:
“Parece difícil observar as cartas de Deus. Mas sequer por um instante posso acreditar que Ele joga dados".
O que também pode ser entendido de forma muito simples: nada na natureza ocorre por acaso como num lance de dados. Pelo contrário, se soubermos com detalhes as causas que antecedem um acontecimento, poderemos prever com precisão a ocorrência desse fenômeno. Para Spinoza e Einstein existe na Natureza uma sólida cadeia de causas e efeitos que se sucedem no tempo. O conhecimento correto é assim trilhar essa cadeia fazendo previsões do que ocorrerá a partir do que ocorreu. O presente é conseqüência da história, assim como o futuro será conseqüência do presente.
Já na interpretação dominante da Teoria Quântica não se pode saber simultaneamente a posição e a velocidade de um corpo. Assim se meço a posição perturbo sua velocidade a tal ponto que não posso saber aonde o corpo se deslocara depois da medida. E reciprocamente se meço a velocidade com precisão sua posição ficará total ou parcialmente desconhecida. Este é a famoso principio de indeterminação ou incerteza de Heisenberg, verdadeiro axioma da Teoria Quântica. Não podemos saber ao certo se a cadeira que vemos a nossa frente está de fato ali. O simples fato de observá-la faz com que ela saia de lá com paradeiro desconhecido, só nos restando atribuir probabilidades de onde poderá estar!
Portanto, ao contrário de Spinoza e Einstein os quânticos afirmam que não se pode ter um conhecimento completo do estado presente de um corpo, pois para saber para onde este corpo  está precisamos interagir com ele de forma que o perturbaremos de forma irreversível. Só poderemos atribuir probabilidades onde o corpo pode (ou não) estar!
Einstein e Spinoza acham que Deus não era maldoso, a ponto de fazer os objetos fugir ao se tentar localizá-los e não se poder saber onde estão e, ao mesmo tempo, aonde irão. Ele não joga dados, fazendo o mundo se transformar num cassino de apostas. Einstein então desafia-O para uma partida de xadrez cósmico, tentando descobrir algumas de Suas regras, em silêncio, mesmo sabendo que vai perder ou, na melhor das hipóteses, empatar o jogo. Lembre-se que Deus se contrai para criar o mundo e O vemos através de várias cortinas ou atributos que filtram a Sua infinita luz! Certa vez Einstein escreveu em uma carta ao físico americano David Bohm: “Se Deus criou o mundo, sua principal preocupação certamente não era facilitar o entendimento para nós”. Einstein acreditava, pois na possibilidade de conhecer, pelo menos em parte, as regras que Deus criou para esse grande tabuleiro de xadrez que é o universo.
A interpretação da escola de Copenhague ao qual Heisenberg e Bohr são os principais representantes parece mais próxima de uma filosofia do sujeito, de cunho pós-metafísico (neo-kantiana), na qual a observação e a descrição humanas desempenham um papel preponderante. A citação abaixo parece sinalizar para esta aproximação.
Heisenberg nos diz:
“Na ciência, o objeto da investigação não é mais a natureza em si, mas a natureza submetida à interrogação dos homens (...) na mecânica quântica era necessário encontrar fórmulas matemáticas que expressassem, não a natureza, mas sim o seu conhecimento (...) A incidência do método modifica o seu objeto e o transforma até o ponto em que o método não pode mais se distinguir do objeto”.
Como afirmou Protágoras, o homem é a medida de todas as coisas! Para Heisenberg e os quânticos, o mundo nada mais é que observação humana. E esta perturba de forma irreversível os objetos lançando-os num campo de probabilidades. Não vemos o mundo nem a natureza como ela é, mas apenas como resultado de nossa ação de observá-la e nossa ação perturba de tal modo os objetos observados que estes se tornam indeterminados no espaço. A Teoria Quântica cria assim um sujeito que é um monstro grego de duas cabeças. A primeira delas é a do Homem Vitruviano de da Vinci, centro do universo, que resgata sua posição central! Mas a segunda cabeça é a de uma serpente que se devora pelo rabo, pois à medida que homem observa o mundo destrói sua previsibilidade, introduzindo-lhe perturbações que o tornam imprevisível. Para eles, a ciência é a descrição que os homens fazem do mundo e não o descobrimento de um mundo construído com regras divinas!
Desta forma, Heisenberg, Bohr e os quânticos jogam dados com Deus porque alegam  jamais poderem ver o tabuleiro, nem suas peças, por completo, mas apenas uma parte que aparenta ser contingente e aleatória. A natureza é como uma mulher de dois véus, jamais se deixando ver por completo. Ao se descobrir o véu da posição, a velocidade fica completamente coberta pelo véu da incerteza. Se souber onde estás não saberei aonde vais... és como um vagalume piscando na noite escura: vejo uma piscadela ali, mas não sei onde será a próxima.  E se souber aonde vais, não saberei onde estás: és um raio de luz, vejo sua direção e sentido, mas não sei onde está a luz. Não posso saber mais do que isso: ou vejo vagalumes piscando a esmo na noite escura ou vejo feixes luminosos sem posição definida.

HOMEM PARTE DA HUMANIDADE OU MODO DE SER DA NATUREZA?

O pensamento científico desde o século XX encontra se, na verdade, irremediavelmente dividido entre essas duas escolas. De um lado, o realismo spinoziano- einsteiniano e, de outro, a irredutível indeterminação proposta pelos físicos quânticos da Escola de Copenhague, liderados por Bohr, Heisenberg e Born, dentre outros. Para Einstein, herdeiro da tradição realista, todo fato tem uma causa que o antecede e o determina necessariamente, seja ela oculta ou não. Nada pode ser diferente do que realmente é, e nada ocorre acidentalmente ou de forma contingente. Somente a ocultação de uma ou mais causas se nos apresenta na forma de contingências, como reza a quarta proposição de Spinoza acima citada. O acaso é fruto apenas de nossa ignorância acerca das causas e não uma condição ontológica e irredutível da natureza. Já para os últimos, provavelmente influenciados por uma visão ora neo-empirista ora pragmatista,— quem poderá determinar ao certo de onde vêm as influências do pensamento? — o acaso e a contingência seriam essenciais a todo processo de conhecimento e uma coisa pode ser e não ser, ou ocorrer ou não, de forma imprevisível ou dependendo de como é percebida.
Contrariando as quatro proposições da Ética, acima expostas, nada podemos afirmar ou prever com certeza, e assim uma causa pode desencadear um efeito apenas provável, e, reciprocamente, um efeito pode ter uma causa apenas provável. Aliás, nada garante que haja um processo de produção ou gênese de fatos.
Para Einstein, essas idéias de contingência do universo, soavam como um perigoso conformismo com o desconhecimento e a magia. De fato, toda mágica consiste na ocultação proposital de uma ou mais causas que a produzem, ao se descobri-las cessa a magia e seus efeitos ilusórios. Assim, para ele, se um coelho foi tirado de uma cartola, ele já estava lá, oculto num fundo falso. Já para Bohr, o coelho é o colapso de uma realidade múltipla, ou a atualização de uma existência em potência na qual estão superpostos estados “coelhos” e “pombas”, e somente depois de consumado o ato de observação, surgem coelhos ou pombas, a depender do tipo de cartola utilizada... Ora, por trás das concepções antagônicas de Einstein e Bohr, ocultam-se visões culturais francamente distintas.
Se Einstein é um herdeiro do spinozismo realista do séc. XVII, onde há uma ordem, imanente à natureza, que segue seu curso independentemente da vontade e das representações humanas, Bohr e Heisenberg, e seus seguidores, parecem preferir trilhar por um instrumentalismo pós-metafísico, devolvendo ao homem o papel de protagonista ontologicamente central do processo de aquisição do conhecimento. Resultam daí o acaso e a contingência como conseqüências desse processo onde o homem é sujeito de seu livre-arbítrio, tendo o poder da escolha final, pois, a depender de como constrói seu experimento, seu objeto atualizar-se-á de formas distintas, ocultando sempre alguns aspectos da realidade física. Se em Einstein, via Spinoza, o homem é apenas um elo da cadeia substancial infinita, em Bohr ele é o sujeito central do conhecimento, ainda que não possa determinar, com absoluta certeza, o que irá observar. A comunidade científica parece ter aderido às idéias de indeterminação, à não divisibilidade de um todo em partes interagentes e a um crescente pragmatismo em que as teorias científicas nada mais devem ser do que descrições convenientes do mundo visto como mera representação humana. Ao passo que os realistas preferem perceber o homem como uma minúscula porção de um universo regido por leis invariantes e imutáveis de causalidade local. Dito isto de outra forma, enquanto Einstein prefere buscar a natureza que vige em sua realidade soberana nas próprias coisas, independentemente da observação humana; Bohr e os quânticos preferem ver o homem como o mais eloqüente intérprete da natureza que se desdobra frente ao seu olhar, como convém ao eloqüente sujeito pós kantiano.
Deixo ao leitor a iniciativa de exercitar seu livre arbítrio — se bem que para Spinoza e Einstein também este último é uma ilusão — com o intuito de decidir entre visões de mundo tão radicalmente distintas e irredutíveis. Vocês preferem jogar xadrez com Deus, tentando entender suas regras ou esperar que Ele jogue dados, decretando seus destinos ao acaso?

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